o plano secreto

quase nunca me diziam "não", se me diziam eu chorava. se faziam "nãozinho" com o indicador, meu beiço virava. eu quase nunca pedia nada que tivesse "não" como alternativa de resposta. deixei de ganhar muitas coisas e participar de muitas atividades divertidas na minha infância pelo maldito medo do "não". por exemplo, eu nunca pedia uma máquina de sorvetes porque sabia que o nosso papai noel não era tão rico quanto o da vizinha. eu fazia associações muito simples e lógicas: a casa deles era muito mais linda que a nossa, logo, enfim, papai e mamãe não teriam uma casa feia por prazer, verdade?
mas o que eu queria contar hoje tem a ver com voar de balão e não sobre o natal que me deram um telefone de plástico cujos números eram pintados e nem baixavam quando apertava, enquanto a vizinha ganhava a máquina de fazer pipocas mais linda do universo.
eu tinha uns cinco anos, o pai me levou na FEISMA e lá tinha um balão. as crianças ricas pagavam pra subir uns 10 metros nele e seus pais ficavam embaixo tirando fotos. como deduzi que era caro, não pedi se podia ir. não pedi nada nessa feira. o pai me deu um palhacinho que saltava de um cone. eu voltei pra casa com um plano: fugir no balão da feira, afinal, eu era muito infeliz. HAHA.
então desenhei tudo, guardei o caminho até a feira, roubei uns pacotes de bolacha quando todos foram dormir, guardei minha boneca e meu casaco amarelo na lancheira. estava nervosíssima com a minha partida. chorei porque ia sentir saudade. a babá perguntou porque eu chorava. então disse que não queria fugir. e contei tudo. de-sa-ba-fei.

no outro dia meu pai perguntou porque eu não tinha dito que queria voar de balão. é que eu tinha vergonha.